Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.
Textos / Paulo Herkenhoff, 2016
Paulo Herkenhoff
INTRODUÇÃO
Pensar a dimensão mais extensa e profunda da pintura de Niura Bellavinha requer desenvolver uma visão transversal da história e dos meios, compreendendo que o caudal linguístico da arte converge sempre para o projeto da artista de pintura expandida ao longo de três décadas, porque deslocada da condição de objeto para ativação de processos semânticos e polissemização do signo. O presente ensaio caracteriza-se por uma constelação de argumentos, não necessariamente concatenados entre si pelos estilemas água e óxido de ferro, por alguma razão lógica em termos do vocabulário da mineração, pois o discurso crítico persegue a faiscação de ideias, a disponibilidade dos olhares diante das hipóteses suscitadas por esta arte. Em dimensão fenomenológica, o texto esforça-se por apreender cintilâncias provenientes da pintura de Niura Bellavinha. A expansão da pintura nesse corpus propõe um recorrido complexo entre história, tradições e possibilidades.
O que se pratica é uma ars pictorica de desvios formulada pelo pincel, por baldes d'água, corpos, câmeras de vídeo, meteoritos, máquina fotográfica, pipas e outros meios. Até aqui, a obra feita é uma incessante expansão do signo da pintura através de algumas experiências-limite: a goteira como pincelada, uma estrela cadente como pigmento, um espelho d'água como suporte da pintura. A obra é um vasto ensaio de visibilidade errante. Este texto vara transversalmente a pintura para pinçar singularidades e diferenciar similitudes, para justapor tradições e experimentos.
Uma perspectiva da obra de Niura Bellavinha está na polissemia da água e não em sua redução à condição de estilema. O estilema diria de um traço invariante de um estilo, afirma Luiz Carlos Costa Lima.' Sob um regime da variança semântica, a água é o elemento que toma uma multiplicidade de tarefas e qualidades como água especular, água lente, água dissipação, água ígnea, água diluente, água significante, água significado, água semântica, água lógica, entre outras, no caudal da linguagem pictórica. Essa água, singular e múltipla, leva a Gaston Bachelard e a Clarice Lispector, a Maurice Merleau-Ponty e a Luce Irigaray, a Zygmunt Bauman e a João Guimarães Rosa. Do mesmo modo, o entendimento da pintora Niura Bellavinha conduz a pensar outros artistas de sua geração, como Caetano de Almeida, Ana Horta, Daniel Senise ou Adriana Varejão. A análise de certos regimes escópicos pode ignorar que o gênero condiciona a produção, a circulação social e a apropriação econômica da pintura? Diante da arte como investimento de capital, usar projeção de video sobre a tela como conclusão do processo pictórico ou aplicar pó de meteoro como pigmento agrega ou retira valor da pintura?
O corpo e sua ausência, a lentidão e a repetição, o investimento do desejo, o acúmulo de capital, o regime de trabalho, a espera são motores e tempos que tropicam como a pedra no poema antropofágico "No meio do caminho" (1928), de Carlos Drummond de Andrade. "[...] No meio do caminho tinha uma pedra./ Nunca me esquecerei desse acontecimento/ Na vida de minhas retinas tão fatigadas./ Nunca me esquecerei que no meio do caminho/ Tinha uma pedra. [...]* Uma tarefa da cultura no Brasil é construir a poética da pedra, como no conjunto de 12 estátuas de profetas em pedra-sabão, no adro do Santuário de Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no sacro monte de Congonhas, MG (1800-1805). Os pintores Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), Frans Krajcberg, Manfredo de Souzanetto, Niura Bellavinha e Carlos Vergara extraíram cor de pedras e do solo. Para eles, a questão é desentranhar a pintura que está latente na pedra, à espera do pintor. Isso reverte o dito de Michelangelo, para quem a pintura seria per via di porre, posto que adiciona matéria, e a escultura, per via di levare, porque elimina a matéria. Portanto, a pedra não contém o corpo de Davi ou outra figura tridimensional, como era para Michelangelo, mas contém a superficie-cor arrebatada da paisagem e do solo. Pelo fato de essa pintura ser necessária à definição do código e do signo pictórico a partir de Minas Gerais, em ciclo de dois séculos, é que ela também é, ipso facto, necessária à compreensão da própria intempestividade da pintura no Brasil.